Não somente. O DEM tem uma trajetória histórica complicada. Trata-se de um partido bisneto da velha UDN, especialista em conspirações pré-golpe de 1964. A legenda foi fulminada pelo fim do sistema pluripartidário de então, com o Ato Institucional No.2, baixado em 1965. Transformou-se em Arena, na ditadura; PDS na sequência; depois PFL e, por fim, no DEM, que não conseguiu afastar a herança, mesmo com a mudança de nome.
Recai sobre a legenda um estranho azar. Se nunca teve jeito para ser oposição desde a época udenista, agora é marcada por acontecimentos que envolvem corrupção, mesmo que o partido queira se livrar desse incômodo. Isso aconteceu no Distrito Federal com o governador José Roberto Arruda e, agora, com o falso catão, senador Demóstenes Torres.
No caso brasiliense, a cúpula do DEM foi rápida e expulsou Arruda. No escândalo do Senado, o presidente da legenda, José Agripino, pensa em movimento semelhante, mas a situação é mais difícil. Arruda tinha um histórico que vinha da quebra do sigilo do painel do Senado. Era recorrente em mutretas. Já Demóstenes passava a imagem de um político puro, condenando e pedindo a punição de corruptos da tribuna do Senado. A dor é maior. O partido espera que parta do senador a iniciativa de seu desligamento, já que o Supremo Tribunal Federal vai investigá-lo após acatar a denúncia feita pela Procuradoria-Geral da República.
O senador era tido como o oposto de Arruda e, assim, um nome com o qual o DEM combatia os “malfeitos” da República. O peso é diferente, daí mais doloroso para os Democrata. Se a iniciativa partir de Demóstenes, se possível com a renúncia do mandato, menos mal. Caso contrário, volta a se manifestar o azar que ronda a agremiação, que tenta se revigorar eleitoralmente e se vê diante de obstáculos difíceis de transpor.
Em ano eleitoral como este, os Democrata têm, ou tinham, a esperança de melhorar a sua presença política conquistando prefeituras, entre as quais a de Salvador, alvo do deputado ACM Neto, que lidera a bancada do partido na Câmara. Nesta semana que se findou, lideres e dirigentes regionais do DEM, especialmente candidatos, passaram a se preocupar com o estrago que o escândalo projeta sobre a legenda. Estão a cobrar, insistentemente, uma saída rápida para o caso Demóstenes. O partido sabe que o golpe atinge eleitoralmente os candidatos que se submeterão às urnas deste ano. A cúpula partidária tem o mesmo entendimento. Tanto assim é que ACM Neto tem se reunido com o líder no Senado, José Agripino, também presidente do partido, para encontrar uma solução. Qualquer uma que seja o partido vai sangrar. Quanto mais demorar, pior.
O que se passa com o DEM? Será que está a pagar o preço dos pecados cometidos ao longo da história desde o bisavozinha, a UDN de Carlos Lacerda, responsável direto pelo suicídio de Getulio Vargas e 1954 e conspirador-mor do golpe de 64? É uma carga efetivamente pesada, porque o temor de seus integrantes é que o DEM continue a definhar até encontrar a vala comum dos partidos mortos. Aqui na Bahia, no auge da força carlista o então PFL chegou a espraiar o seu comando sobre 84% dos municípios baianos. Há de se considerar, no caso, que a força partidária do grupo de ACM se dispersava. Não estava tão somente concentrada no PFL. O líder costumava satelizar o seu poder, enfeixando-o a partir da ocupação de diversos partidos, que comumente disputavam prefeituras um contra o outro. Aliás, nada diferente do que acontecerá este ano, com prefeituras almejadas por legendas da base aliada governista. A diferença está no fato de que a Bahia hoje está democratizada com Wagner.
Os candidatos do partido, enfim, estão em desconforto e alegam que não podem esperar muito por uma decisão de Demóstenes, se imolando, ou da cúpula partidária, expulsando-o. De fato, quanto mais demorar, pior, porque o nome Democrata, assim dizem eles, passou a ser demonizado em todo o País. É uma realidade, se houve uma estupefação nacional com o que foi descoberto acerca de um senador que cobrava dos parlamentares e da República uma ação pronta e exemplar conta a corrupção, o que dizer dos eleitores? O escândalo não alcança somente o eleitorado do DEM, mas sim os políticos de modo geral, cuja imagem junto a opinião pública é péssima. O raciocínio que se faz é direto, quase semelhante ao que está logo acima sobre o pensamento dos eleitores: se o senador Demóstenes, que combatia a corrupção, também a praticava, o que imaginar dos demais políticos?
*Coluna de Samuel Celestino publicada no jornal A Tarde deste domingo (1º)
Postar um comentário